Atuação do terceiro setor foi fundamental nos primeiros momentos da pandemia. ONGs alcançam parte da população ignorada pelo Estado Comemorado em 20.10, o Dia Nacional da Filantropia surgiu há uma ano com a aprovação da lei 2117//2019.
A palavra filantropia vem dos termos gregos philos e anthropos, que significam respectivamente “amor” e “ser humano”. Ou seja, podemos dizer que a filantropia significa amor ao ser humano, ou à humanidade. A filantropia no Brasil remonta à época do descobrimento, com a fundação da Santa Casa de Santos, em 1543 — detalhou Irajá quando o projeto foi aprovado em setembro..
A Santa Casa de Santos oferecia abrigo e alimentação e, com o passar dos anos, as instituições filantrópicas modificaram-se e multiplicaram-se. Hoje, mais de 9 mil instituições beneficentes de assistência social praticam a filantropia de forma reconhecida pelo Estado brasileiro, “formando uma rede importante de entidades que buscam ajudar o próximo, complementando e muitas vezes substituindo o papel do poder público”.
A filantropia é uma prática filosófica de compaixão pelo semelhante e de caráter altruísta, pois promove a inserção de pessoas em um “sistema organizado de construção do desenvolvimento, por meio da promoção da saúde, da educação, da capacidade profissional, da conscientização em relação ao ambiente em que vivemos, tendo uma capilaridade que lhe permite chegar onde o Estado não consegue, com eficiência, economia e dedicação, sendo os desafios encarados como missão”.
Pandemia incentiva o desenvolvimento da cultura de doação no Brasil
De acordo com a edição 2020 do relatório ‘Brasil Giving Report: Um Retrato da Doação no Brasil’, oito em cada dez brasileiros (82%) acreditam que as organizações da sociedade civil (OSCs) apresentaram um impacto positivo no país, no último ano. Na pesquisa anterior, 73% dos brasileiros tinham esta percepção. A visão positiva em relação às OSCs se reflete no aumento das doações durante a crise causada pela Covid-19.
“As pessoas estão percebendo a diferença que essas organizações podem fazer na sociedade. Isso faz com que, neste momento, se coloque a doação como um ato de cidadania. Estamos criando a base para desenvolver uma cultura de doação forte no país”, comenta Paula Fabiani, diretora-presidente do IDIS.
O que motiva a doação?
Com base na pesquisa ‘Brasil Giving Report’, as causas que levam à maior parte das doações no país são: organizações religiosas e igrejas (49%), crianças ou jovens (39%) e o combate à pobreza (30%).
O relatório revela que a proporção de brasileiros que fazem trabalho voluntário não muda desde 2017, atingindo metade dos entrevistados (53% em 2019 e 2018 contra 52% em 2017).
Entre as principais razões para doar descritas pelos brasileiros estão: “Porque me sinto bem” (52%); “Preocupar-se com a causa” (44%); e “querer ajudar as pessoas menos favorecidas” (43%).
Para Marcia Kalvon Woods, presidente do conselho da Associação Brasileira de Captadores de Recursos (ABCR) e membro do comitê gestor do Movimento pela Cultura de Doação, a sociedade brasileira mostrou como pode ser solidária durante uma pandemia.
“Desde março percebemos essa mobilização, seja entre as empresas ou com as campanhas que surgiram. A sociedade civil se engajou muito rápido mostrando a importância das organizações para entregar esses serviços. O Brasil tem retratos segmentados do engajamento das doações, e esse é um setor que precisa de dados e informações para uma ação forte”, pontua.
Ela ainda destacou o aumento nos valores arrecadados pelo Monitor das Doações – Covid-19, promovido pela ABCR, que em pouco mais de três meses chegou a R$ 5,9 bilhões.
“A pandemia deixou evidente a nossa relação de interdependência. O Brasil só vai se desenvolver se olhar para o outro. É fundamental manter a população sensibilizada em relação às demandas que vêm ocorrendo, percebendo a diferença que pode fazer”, esclarece Marcia.
A importância da transparência em relação aos recursos doados foi destacada pela especialista em planejamento financeiro e CEO da Me Poupe!, Nathalia Arcuri. Para ela, esse é um dos obstáculos que afastam a população de uma cultura de doação. “Se recebe muito pouco pelo trabalho no país e ainda se perde muito com juros e impostos. A sensação de desvantagem é grande e a doação aparece como um prejuízo. Uma das ações para vencer isso é mostrar para onde vai esse dinheiro. A transparência traz uma sensação de um ‘rendimento positivo’ daquela doação”.
Ela reforça o papel da doação de tempo, como o serviço voluntário e a mobilização para a arrecadação de recursos, práticas que devem ser incentivadas. “Quando olhamos para quem precisa, só o dinheiro não basta”.
Já Adriana Barbosa, CEO da PretaHub e fundadora da Feira Preta, destacou o papel do empreendedorismo nos últimos anos e a importância de incentivar os pequenos e médios empreendedores em meio à crise atual. “A população negra é empreendedora desde o processo de abolição da escravidão. Agora, no contexto da pandemia, em que é a mais afetada em todos os sentidos, estamos apoiando os micros empreendedores por meio de um fundo coletivo. É uma doação, não empréstimo. Buscamos uma forma de colaborar e que não funcionasse como um novo agente de endividamento”, explica.
Para Adriana, não tem como olhar para o investimento privado e filantrópico sem o recorte de gênero e raça. “Várias plataformas de financiamento coletivo surgiram neste contexto. As mulheres negras são a maioria no front do empreendedorismo, e as mais impactadas. Sem um olhar direcionado, ficam de fora dos investimentos”.
Caminhos e escolhas na hora de doar
A segunda mesa do seminário trouxe uma reflexão sobre a doação no Brasil. Além disso, os convidados apontaram como o meio digital pode se tornar uma ferramenta de apoio na captação de recursos e na mobilização de voluntários.
Luiza Trajano, presidente do conselho do Magazine Luiza e do Grupo Mulheres do Brasil, argumentou que a cultura de doação estava longe do ideal, mas que a solidariedade alimentada pela pandemia potencializou um reconhecimento destas ações.
“Nossas desigualdades foram escancaradas. Esse espírito de comunidade se solidificou entre os consumidores, promovendo um aumento da consciência em relação ao nosso papel como indivíduos. As pessoas estão se sentindo responsáveis por essas causas sociais que começaram a apoiar”.
Tornar a cultura de doação algo simples é essencial para fidelizar doadores. Rodrigo Pipponzi, diretor-executivo da Editora Mol, reforça que as estratégias das lives, que colocam um QR Code para a doação na tela, é a exemplificação da praticidade da doação.
“A pandemia trouxe um aumento da impressão de que a nossa responsabilidade é do tamanho dos nossos privilégios. A doação precisa fazer parte do nosso cotidiano como um ato didático. As empresas vêm e se apoiam no terceiro setor, buscando ter esse exercício empático de entender o que acontece na ponta por meio das conversas com os líderes comunitários”.
Para ele, a pandemia vem ensinando a prática e os impactos de doar. “Essa pandemia nos ensina a olhar para dentro e entender as ferramentas que temos para agir na sociedade”.
Fonte: Agência Senado e Observatório3setor/Mariana Lima